Lutar Não é Crime!
A Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, junto a diversas parceiras na luta pela vida das mulheres, meninas e pessoas que gestam, vem manifestar seu apoio e solidariedade às organizações, movimentos e defensoras de direitos humanos que têm sofrido tentativas de criminalização por atuarem na defesa e garantia do aborto no Brasil.
Vivemos, nos últimos anos, um agravamento da luta pela saúde e autonomia das mulheres, crianças e pessoas que gestam. São diversos os casos em que mulheres, meninas e pessoas que gestam sofrem omissões e violências institucionais ao buscam o acesso ao aborto legal e seguro, sendo privadas do acesso à informação e impedidas de acessarem o procedimento com base em barreiras não autorizadas por lei. Ainda, pessoas com complicações de aborto e emergências obstétricas são maltratadas e até mesmo denunciadas à polícia por profissionais que deveriam assegurar-lhe acolhimento e atendimento humanizados.
O Brasil é um dos países que mais persegue defensoras e defensores de direitos humanos, especialmente aqueles que atuam em temas objeto de estigma social, como os direitos sexuais e reprodutivos. Recentemente, aliás, o país recebeu um chamado da Organização das Nações Unidas - ONU para que cesse perseguições a defensoras do aborto legal, a partir das ofensivas sofridas por jornalistas e advogadas que atuaram no caso da menina de SC, que foi alvo de violências institucionais ao, grávida em decorrência de estupro, buscar o acesso ao aborto legal.
Em todos esses casos, diversas organizações e defensoras de direitos humanos oferecem apoio jurídico, de saúde e político às mulheres e crianças que têm seus direitos violados, atuando de forma a contribuir para o acesso efetivo ao aborto legal.
Como contrarreação, temos observado um momento de aumento da tentativa de criminalização dos nossos movimentos, organizações e ativistas, seja por intimidações, tentativas de silenciamento, e até mesmo uso abusivo de mecanismos judiciais para a perseguição. Com espanto, assistimos às instituições do Estado levando adiante essas tentativas de criminalização, sendo necessária novamente a atuação de nossas organizações, movimentos e ativistas para cessar a tentativa de intimidação.
Recentemente,por exemplo, vimos as perseguições contra jornalistas, profissionais de saúde e advogadas que atuaram no caso da menina de SC. Uma CPI voltada a criminalizar o acesso ao aborto legal foi aberta e concluída de forma absolutamente ilegal, inconstitucional e contrária a tratados de direitos humanos assinados pelo Brasil Também assistimos a tentativas de criminalizar o debate democrático sobre a descriminalização do aborto, inclusive com a submissão de defensoras do direito ao aborto legal a investigação tão somente por exercerem a defesa democrática desde direito fundamental para mulheres, meninas e outras pessoas que gestam.
É nesse sentido que nos levantamos e reafirmamos que nossa luta para garantir o acesso ao aborto por mulheres, meninas e pessoas que gestam no Brasil jamais pode ser considerada ilegal. Perseguir, promover a perseguição e criminalizar defensoras do direito ao aborto legal trata-se, acima de tudo, de um atentado a democracia e aos direitos humanos, do qual fazem parte os direitos sexuais e reprodutivos. Não há espaço no Estado Democrático de Direito para a persistência deste grave cenário. Nós, organizações e defensoras de direitos humanos, possuímos um papel essencial no fortalecimento democrático voltado ao reconhecimento do direito de mulheres, meninas e pessoas que gestam à autonomia, à saúde e a uma vida livre de violência de qualquer natureza.
Por todo o exposto, reforçamos a necessidade de que a atuação de organizações, movimentos e ativistas em favor da descriminalização e legalização do aborto seja protegida e que tentativas de criminalização dessa atividade sejam cessadas, sendo urgente a criação de canais seguros e eficientes para o recebimento e apuração denúncias dos diversos casos que temos acompanhado. É urgente que toda e qualquer tentativa de criminalização em curso - seja por meio de inquéritos, processo penais, representações ou atos políticos - sejam cessadas, sob pena de responsabilização do Estado brasileiro e seus agentes. Reivindicamos uma atuação proativa do Estado na promoção da defesa de defensoras de direitos humanos.
Vencemos um momento nefasto da nossa história, que ainda reverbera negativamente na defesa pelos direitos humanos. Precisamos agora impedir que essa onda contra nossas vidas e nossos corpos continue. O crime é de quem não garante direitos e não de quem os defende. Não podemos aceitar que seja perpetuado uma lógica de silenciamento e apagamento da nossa luta pelos grupos e atores que, cotidianamente, tentam nas diversas formas anular a garantia e ampliação de direitos.